sábado, março 15, 2008

Correr




O sol nasceu. Momento exato para se começar o dia. Pelo menos para alguém que encobria sua madrugada tumultuada cheia de segredos e pecados na claridade ofuscada pela cortina vinho na janela de seu quarto pela manhã. A manhã sempre fora fictícia...era escura, negra como a noite...a escuridão que escolhera diferentemente daquela imposta pelo sistema solar.
Agora já não mais fugia da claridade, da luz. Precisava enfrentá-la e assim o faria. Tentaria fugir, mas enfrentaria. Esse paradoxo dava vida à sua conturbada vida. Vida esta que há poucos anos não mais aceitava.


Abriu a porta. Lagoa Rodrigo de Freitas. Lembrou da canção "O Rio de Janeiro continua lindo". Deu um sorriso de soslaio, meio satisfeito com o que Deus tinha feito e meio infeliz por não saber reconhecer da maneira que queria.

Foi até a calçada e correu. Corria para fugir e enfrentar ao mesmo tempo. Aparentemente corria sem motivo especial, mas sabia que a corrida iria dar em alguma coisa. Na calçada, num domingo qualquer sentiou que a vida pulsava dentro dele e nisso queria acreditar. Estava ali correndo, sob o sol de uma tarde comum, ultrapassando as pessoas como um jogador de futebol faz no campo ao driblar os oponentes. Mas ele não tinha oponentes. A única oponente era a vida, mas essa é impossível de driblar.

Correr por pura e simples vontade. Criaria a tautologia do correr. Sentir em seus músculos em ação, seu esforço surtindo efeito, a respiração num ciclo perfeito, o rítmo constante dos braços impulsionando a corrida, o vento batendo em seu rosto e levando com ele todo o medo, toda a insatisfação perante a dádiva maior de Deus.

Pensamentos em fofo num único objetivo: Correr. Nem Tom Hanks em Forest Gump correria mais, nem Lola Rennt. Ninguém era capaz de tirar sua concentração. Tinah apenas um desejos: se superar, correr, enfrentar, desafiar seu corpo, desafiar sua mente e, claro, nunca cair. Duelava e Combatia consigo mesmo. Uma batalha silenciosa a qual nenhum mortal conseguiria entender. Se sentia superior, saberia dar valor à vida como nenhum ser humano jamais conseguiria. Poderia olhar novamente para a luz, para a claridade. Só não podia cair, mas corria. E a velocidade aumentava cada vez mais. Numa linha reta naquela calçada, ele corria silenciosamente, sem parar. Correr até não conseguir respirar, até as gotas de suor caírem, até sentir sua mão úmida e cansada. Corria. Rápido, cada vez mais rápido. Correr sem se importar com a linda paisagem, com as pessoas que porventura tentariam o acompanhar, sem se importar com os acenos dos conhecidos. Correr e aprender a viver.

O coração bate acelerado. Enfrentava a vida. Corre. Um jovem de bicicleta tenta acompanhá-lo, sem sucesso.Um cachorro passa em sua frente atrás de um brinquedinho jogado por uma criança. Quase atropela uma madame que levava seu poodle rosa para um passeio. Espantou um bando de pombos. Corria mais. A respiração já estava ofegante, a garganta seca as roupas encharcadas de suor. Precisava parar. Estava exausto. Mãos doendo. Mas não pára. Corre. Corre. Corre. Correndo para viver, para sobreviver ao passado, aos erros, ao desastre, à dor. Desfazer o paradoxo, reconhecer que apesar da dor, há esperança, há vida. Aprender o novo e esquecer o velho. Ir para longe. Bem longe. Longe de tudo, sem se dar conta de que o longe é bem ao lado, é bem perto, é bem íntimo. Correr para perto de si. Ele contra ele mesmo. Ele contra o destino. Corria....

Mas de repente avistou uma ladeira. Descia descontrolado. O coração disparou. Sentia que ia cair. Não conseguia parar. Estava veloz, rápido. Muito rápido. Gritou. Mas não sentia medo. Libertou-se. Sentia-se livre. Encarava a luz. E quando uma pedra bateu contra a sua cadeira de rodas, foi lançado ao longe, caiu na calçada e ficou estatelado no chão. As pessoas se aglomeravam ao redor dele gritando e ligando para âmbulânica, socorrendo ou apenas olhando. Mas ele não ouviu nada. Nunca perdera a concentração. E ele então soltou um sorriso reflexo de seus pensamentos, sentimentos e suas sensações. Catarse. Agora sim sentia o sabor da vida novamente. Agora sim vivia na claridade. Ganhou a batalha e reconheceu seu oponente. Perdoou-se

4 comentários:

Anônimo disse...

ADILSON!!!
O q é esse conto?!?!?!?!?
mto, mto bom!!!
ADOREI!!!
Bjs

Fernanda Maria disse...

Amoreeeeeeeeeeeeeee... EXCELENTE conto!!!

Estou cansada, ofegante...suando e com o coração disparado... des-pa-ra-déééééé-si-moooo!!!

UFA... respira!!!

Mil bjks

Fernanda Maria disse...

Ahhh... esqueci de dizer que o conto é surpreendente...

bjs

Anônimo disse...

Ameeeiii....vc sabe neh??
Sempre escrevendo incrivelmente bem!
Vamos publicar esses pontos e poemas,hein?
bjuuuu